Quando o mês ‘vira’, a mágica acontece. Desde o primeiro dia de junho, as ruas de Cruz das Almas, Senhor do Bonfim, Santo Antônio de Jesus e Amargosa se apresentam com ares diferentes. Do lado de fora, o colorido da decoração de bandeirolas e, dentro das casas, o gosto e o cheiro das comidas típicas. O clima é de festa, alegria, contagem regressiva e…clubismo.
Os moradores ‘vestem a camisa’ das cidades e cada um deles defende com unhas e dentes que o seu município tem o melhor São João. Nessa disputa, os quatro nomes mais cotados têm muito em comum. As guerras de espadas e as festas particulares e públicas são pontos fortes na explicação da atração de tanta gente durante os festejos juninos, seja no passado ou no presente.
AMARGOSA
No Vale do Jiquiriçá, Amargosa ficou conhecida por todo o Brasil por conta do Forró do Piu Piu, na Fazenda Colibri. Eram grandes atrações como Bell Marques, Solange Almeida, Limão com Mel e Magníficos, com ingressos a preços que lembram os acessos aos camarotes no Carnaval de Salvador. Desde 2022, a festa não acontece, mas a cidade continua bombando.
A historiadora Regina Vaz, professora aposentada de Amargosa de 82 anos, conta que o sucesso na cidade começou antes das grandes festas particulares e, hoje, continua por conta da mobilização da prefeitura. “Foi ainda no final dos anos 1990 que o município começou a atrair muita gente de fora para as confraternizações nas praças públicas”, diz.
O potencial foi aproveitado pelo prefeito da época, Francisco Ravelo. “Começaram a vir grandes atrações de várias localidades e a fazerem competição de quadrilhas. A coisa foi crescendo a cada ano e atraindo o público que passou a chegar em ônibus e mais ônibus de Salvador e outas cidades”, continua Regina.
Segundo o prefeito Júlio Pinheiro, a população de 36 mil habitantes costuma dobrar durante as festas juninas e a expectativa para este ano é de mais de 30 milhões de reais injetados na economia. “Foi criando fama a partir dos filhos da terra que moravam fora e vinham para os festejos e foi sendo feito o boca a boca, mas sempre prezando pela tradição e cultura, que são os grandes atrativos”, diz o gestor.
CRUZ DAS ALMAS
Assim como o Forró do Piu Piu, em Amargosa, o Forró do Bosque não acontece em Cruz das Almas desde 2022, mas ajuda a explicar o crescimento dos festejos. O produtor musical da festa, Antônio Dólar, diz que a ideia surgiu em 2000 e foi crescendo. “Era coisa de 97 ônibus bate-volta, estacionamento lotado, muitas casas alugadas, hotéis esgotados. Divulgou muito o São João de Cruz das Almas para todo o Brasil”, lembra Antônio.
Para o historiador Alino Matta, morador da cidade, a festa particular surfou na onda do sucesso porque o que fez Cruz bombar mesmo foram as guerras de espadas. “O pessoal vinha de fora para participar ou para assistir. Era isso que atraía porque a música sempre teve em todas as cidades, os cantores e as bandas saem rodando durante o São João”, diz.
A prática foi proibida, mas a tradição que envolve toda a festa faz o sucesso da cidade continuar. “No passado, os jovens saíam com instrumentos musicais e iam de porta em porta para tocar para as famílias e, em troca, entravam nas casas para tomar licor e comer comidas típicas”, conta Alino.
“As práticas foram remodeladas com o Forró do Bosque e com as festas públicas, mas a maravilha do São João continua”, completa. Segundo a prefeitura, são esperadas 500 mil pessoas nos cinco dias de festa, de 20 a 24 de junho.
SENHOR DO BONFIM
No centro-norte do estado, o município de Senhor do Bonfim, assim como Cruz das Almas, tem a base do seu sucesso junino nas guerras de espadas. Mas a festa vai além disso, não decaindo com a proibição. Como conta o pesquisador e entusiasta da cidade Alex Barbosa, de 46 anos, criador do perfil @minhacidade_bonfim, a partir de 1970 as confraternizações nas ruas ganharam o apoio da prefeitura, com atrações como Luiz Gonzaga.
“O São João se torna a principal festa das cidades do interior e, sendo organizada pela prefeitura, os gestores fazem proveito e acontecem as disputas de um querer fazer uma festa melhor do que o outro”, analisa. Em 2000, o Forró do Sfrega chega para somar, concedendo projeção nacional e fortalecendo o nome de Senhor do Bonfim. A produção também não acontece mais, mas o restante da programação continua atraindo turistas em junho.
Um dos atrativos é a festa Jegue Elétrico, que completa em 2024 29 anos. Tendo início com a reunião de funcionários de um banco depois do expediente com uma carroça levando um sanfoneiro, hoje reúne mais de 1.500 pessoas pelas ruas da cidade. “As camisas são muito requisitadas, a gente às vezes tem 400 pessoas na lista de espera. É gente da Bahia toda”, conta a moradora Jacira Sá, de 64 anos, uma das organizadoras.
Com somente sanfoneiros da terra e um clima familiar, a festa tem, segundo Jacira, o que os turistas realmente querem. “As pessoas estão atrás da verdadeira tradição. Dia 28 de maio é aniversário de Senhor do Bonfim e, desde essa data, a cidade assume o clima. É a festa do ano e todo mundo fica animado, todo morador aqui ama de verdade o São João”, compartilha Jacira.
SANTO ANTÔNIO DE JESUS
No Recôncavo Baiano, Santo Antônio de Jesus já era point junino antes mesmo dos festejos chegarem a palcos montados na cidade. É o que garante o morador e professor aposentado José Gilberto de Jesus, de 64 anos. “Já em 1970, SAJ era grande referência na Bahia, disputando os turistas com Senhor do Bonfim, Cruz das Almas e Amargosa”, diz ele.
Um dos fatores para a fama era a fabricação e o comércio de fogos de artifício no centro do município. “Lembro de gente chegando de outros estados no depósito da minha família para comprar e levar”, conta José Gilberto. Enquanto uns compravam e iam embora muitos ficavam.
Além dos fogos, a sanfona da família Tourinho chamava a atenção. O músico Ray Tourinho, de 71 anos, conta que reunia sanfoneiros para passar pelas ruas da cidade, numa espécie de arrastão. “O grupo ia aumentando a cada ano e virou algo bem tradicional, atraindo turistas”, conta. Mas o São João de Amargosa parecia fazer mais sucesso.
“O pessoal passava por SAJ para chegar à Amargosa e o poder público começou a se mobilizar para fazer concorrência. Foi a junção da prefeitura com os comerciantes locais”. A secretária de cultura, turismo e juventude, Sílvia Brito, destaca que a expectativa durante o São João é dobrar a população da cidade (de 100 mil habitantes). “A gente criou uma rede de hotelaria e de gastronomia que atende bem a quem chega de fora. Sem contar a facilidade de acesso pela BR-101 ou pela Ilha de Itaparica”, justifica a gestora.
Fonte: Correio
Compartilhe esta notícia
Aviso: Os comentários são de responsabilidade dos autores e não representam a opinião do Jornal Zero75. É vetada a postagem de conteúdos que violem a lei e/ ou direitos de terceiros. Comentários postados que não respeitem os critérios podem ser removidos sem prévia notificação.