Bahia

Sem fogo, nem fogaréu: Bahia tem baixa nas festas particulares de São João; das 6 maiores, apenas 1 está confirmada

Enquanto uma chama se apaga com o fim do Carnaval em Salvador e a chegada da Quarta-feira de Cinzas, uma fagulha começa a acender o símbolo de uma das maiores tradições do estado, a fogueira do São João.

O adeus aos sete dias de festa em fevereiro por muitos anos, mas especificamente o fim dos anos 90 e início dos anos 2000, significou o início dos preparativos para os festejos juninos. Porém, desde o fim da pandemia da Covid-19, o braseiro parece ter ficado cada vez mais fraco e o calor do público para as festas de São João se resume a curtir o evento da forma mais prática e barata: nas praças.

Desde 2023, o cancelamento de grandes festas pagas de São João tem chamado a atenção dos amantes dos festejos juninos. No ano passado, o Forró do Lago (2002-2022), em Santo Antônio de Jesus, e o Forró do Bosque (2000-2022), em Cruz das Almas, anunciaram uma “pausa” na realização do evento, sem justificar o motivo do cancelamento.

O Lago, de Bell Marques, foi substituído por uma festa com Henrique e Juliano e Nattan no mesmo lugar em que a festa do Rei do Axé acontecia.Já Bosque e Piu-Piu (1996-2022) ficaram sem substitutos.

A expectativa era de que as festas anunciassem o retorno em 2024, no entanto, a menos de 40 dias para o São João, as produtoras não anunciaram novas edições. O que foi dado ao público em retorno foi o cancelamento de outro grande evento, o Brega Light (2001-2023), em Ibicuí.

Até o momento, apenas o Forró Ticomia (1987), em Ibicuí, está confirmado para acontecer na Fazenda Eldorado, no dia 22 de junho. O evento irá receber apenas atrações do forró e foram anunciados nomes como Xand Avião, Luan Estilizado, Otávio Mateus, Dorgival Dantas, Batista Lima, Lordão e Eric Land. Os ingressos, all inclusive, custam R$ 670.

Ao Bahia Notícias, o empresário Rodrigo Melo, da produtora Pequena Notável, falou sobre o cenário de eventos na Bahia durante o São João. Para Melo, a mudança no comportamento tem a ver com o alto custo de produção dos eventos.

“Esse ano não vai ter nenhuma. A não ser o Ticomia em Ibicuí, nenhuma festa particular, pelo menos que eu saiba, no São João da Bahia. Eu acho que os formatos estão sendo mudados. Eu, Rodrigo, não acredito mais em eventos de grande porte, eventos em que você tenha que pagar o custo com mais de 20 mil pessoas. Eu não acredito pelo tamanho das estruturas que precisam ser montadas, pelo tamanho do artista, pelos cachês que são muito altos também. O bilhete não está pagando toda a estrutura que tem que ser montada para isso.”

Responsável por duas das festas canceladas em 2023, o empresário conta ao site que a Pequena Notável teve como carro-chefe por alguns anos justamente o período junino.

“Nós começamos a fazer eventos, o nosso filão de eventos enquanto produtora, foi com o São João. Nós começamos com o Forró do Piu-Piu em Amargosa, isso em 1997, e de lá para cá, até o ano passado nós fizemos sempre algum evento no São João. Chegamos a fazer o Cerveja e Cia Folia com Ivete em Santo Antônio de Jesus, fechamos uma parceria com Bell Marques, também em SAJ com o Forró do Lago até o ano retrasado, e o ano passado fizemos um forró com Henrique e Juliano e Nattanzinho.”

Além do alto custo para a estrutura do evento, outro fator apontado pelo empresário são os eventos gratuitos em praça pública. Dos 417 municípios da Bahia, cerca de 280, além da capital baiana, recebem grandes apresentações no período junino. “As praças públicas estão investindo muito em atrações grandes, de graça para o povo, e isso também interfere muito nos nossos eventos. Nada contra, mas é um novo cenário que atrapalha as festas particulares. São algumas coisas que atrapalham a venda dos bilhetes.”

Para se ter uma ideia, em 2023, o governo da Bahia fez um investimento superior a R$ 100 milhões para a realização dos festejos no estado. De acordo com Jerônimo Rodrigues (PT), o alto investimento na festa tem como justificativa o retorno que os eventos dão aos diversos setores dos municípios.

“Nós temos um grande objetivo, que é o fortalecimento da cultura do São João, e esperamos que este ano as festas sejam ainda mais arrojadas do que no ano passado. É um período em que se aquece diversos setores da economia, como comércio e turismo, e gera emprego e renda. E o Governo do Estado está investindo pesado, aplicando mais de R$ 100 milhões”, afirmou o gestor estadual.

De acordo com a Secretaria de Turismo do Estado (Setur), o São João 2023 promoveu um fluxo de 1,5 milhão de turistas no estado e gerou uma receita de cerca de R$ 1,5 bilhão para a Bahia. As cidades mais procuradas pelos turistas eram justamente aquelas com os eventos privados, Amargosa, Ibicuí, Santo Antônio de Jesus, Irecê e Senhor do Bonfim, que registravam quase 100% da ocupação de hotéis.

O empresário analisa que o investimento dos municípios nos grandes artistas tem minado o público das festas e não é mais rentável a produção de um evento, mesmo com a oferta da exclusividade através das camisas, do open bar e all inclusive.

“[É uma combinação de fatores], principalmente o investimento das prefeituras nos grandes artistas. O público não vai pagar por um evento particular já que ele tem todas as atrações de graça na praça. Acho que o serviço que nós oferecemos para esse público nos eventos, como o open bar, o all inclusive, ficou pequeno diante de toda a atração e a estrutura que as grandes praças estão colocando.”

Como comparação, Melo cita o São João de Santo Antônio de Jesus, onde realizava o Forró do Lago. “São dois palcos imensos, com grandes atrações, cem mil pessoas. Com camarotes, estrutura. E isso impede um pouco da gente investir tão alto em eventos particulares.”

Entre as atrações do São João de Santo Antônio de Jesus, que neste ano acontece entre os dias 20 e 24 de junho, estão: Leo Santana, Wesley Safadão, Maiara & Maraisa, Xand Avião, Calcinha Preta, Flávio José, Jaldo Rodriges, Tarcísio do Arcordeon, Dorgival Dantas, Lauana Prado, Toque Dez, Estakazero, Cavaleiros do Forró, Daniel Vieira, Lara Amélia e Kart Love.

Já o São João de Senhor do Bonfim, onde acontece a festa Sfrega, terá seis dias de festa e entre as grandes atrações estão Wesley Safadão, Zé Vaqueiro, Flávio José, Nattan, Xand Avião, Adelmário Coelho, Pablo e Tayrone. Até o momento, a organização do Sfrega não anunciou se a festa irá acontecer em 2024. O último pronunciamento da equipe foi para negar um cancelamento que circulou nas redes sociais.

“Pedimos paciência e compreensão enquanto trabalhamos para resolver essa situação. Continuaremos mantendo todos informados sobre quaisquer desenvolvimentos futuros e estamos comprometidos em fazer o possível para encontrar uma solução que seja do melhor interesse de todos.”

Em Ibicuí, cidade onde acontece o Forró Ticomia e era sede do Brega Light, a festa terá duração de quatro dias e shows de Limão com Mel, Aduilio Mendes e da dupla Maiara e Maraisa.

A cidade onde acontecia o Forró do Bosque, Cruz das Almas, a 151,4 km de Salvador, terá quatro dias de festa e nomes do cenário nacional na grade, como Dorgival Dantas, Zé Neto e Cristiano, Matheus e Kauan.

Em Salvador, a festa ainda não teve a grade de atrações confirmadas. Ao Bahia Notícias, o secretário estadual de Cultura, Bruno Monteiro, antecipou alguns detalhes da festa e afirmou que o estado terá como foco em 2024 a valorização das manifestações juninas como forró pé de serra, trios nordestinos, quadrilha e do samba junino.

Neste ano a festa repete a dose no Parque de Exposições com grandes atrações para o público, enquanto o Pelourinho será o palco “de alimentação da cultura tradicional”.

A pergunta que fica é: as festas privadas no São João vão acabar? Para Rodrigo Melo, os eventos particulares podem voltar a acontecer com força nos próximos anos e o mercado pode se readequar à forma de consumo do público.

“O mundo é cíclico. Em um certo momento, as festas particulares levavam a demanda de gente para as cidades. Na minha época do Piu-Piu, a gente levava grande parte de Salvador para Amargosa, porque o evento era muito grande. O evento falava mais alto do que a praça. Hoje em dia a praça fala mais alto que o evento. Mas acredito que pode mudar sim, a gente pode se readequar ao mercado com eventos menores no São João e ir crescendo de novo.”

Fonte: Bahia Notícias

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